Especialista no tratamento de traumas e processo de superação, Dr Julio Peres, analisa as experiências no final da vida e o impacto das visões espirituais ao enfermo e sua família, assim como para os profissionais da saúde que atuam em cuidados paliativos.
De acordo com Dr. JulioPeres, pesquisas recentes demonstram que um grande número de pessoas de distintas culturas têm relatado experiências no final da vida – originalmente chamadas na literatura por end-of-life experiences – sob a forma de visões no leito de morte, sugestivas da existência espiritual.
Esta linha de pesquisa tem trazido contribuições que interessam diretamente aos profissionais que atuam com cuidados paliativos e mais especificamente, aqueles que desenvolveram a Síndrome de Burnout decorrente do esgotamento, angústia e incapacidade perante a falta de recursos para lidar com as sucessivas mortes de seus pacientes.
Relatos de visões no leito de morte encontrados em biografias e literatura de diferentes períodos históricos foram associados com a preparação espiritual da alma para vida após a morte. Quatro recentes estudos realizados na Inglaterra sobre experiências ocorridas 48 horas antes da morte coletaram informações específicas (questionários/entrevistas gravadas) em primeira mão (dos próprios pacientes terminais) e em segunda mão (de familiares, enfermeiros e médicos). As experiências descritas por familiares, enfermeiros e médicos foram vividamente lembradas por sua natureza de conforto espiritual, que em muitos casos ajudaram a abolir o medo da morte. Destacamos algumas informações coletadas de 38 enfermeiros e médicos com mais de uma década de experiência com pacientes terminais e acompanhamento de aproximadamente duzentos pacientes falecidos:
• 62% relataram que os pacientes ou seus parentes tinham falado sobre aparições ou visões espirituais no leito de morte envolvendo familiares falecidos.
• 35% relataram que o enfermo estava cercado de luz no momento da morte.
• 62% relataram que os pacientes tiveram sonhos vívidos que proporcionaram conforto preparando-os para a morte.
• 68% relataram que os pacientes manifestaram o desejo de resolver arestas familiares antes da morte.
• 79% relataram que as visões no leito de morte não poderiam ser atribuídas a alterações químicas no cérebro, à medicação ou febre.
• 50% sentiram que os pacientes que experimentaram visões no leito de morte tiveram uma morte pacífica.
• 83% disseram que não tinham recebido nenhuma formação para lidar com os pacientes que manifestam as visões no leito de morte, e 96% solicitaram enfaticamente uma formação complementar para esse trabalho.
• 82% sentiram-se mais capazes e seguros para falar sobre essas experiências com parentes e enfermos após o estudo realizado.
• 39% observaram que as visões no leito de morte ocorreram no último mês de vida e 46% relataram que as manifestações eram mais comuns nas últimas 48 horas antes da morte.
• 68% sentiram que as visões no leito de morte eram eventos de ordem espiritual e 82% concordaram que essas experiências ofereceram conforto espiritual para o paciente e 79% para os parentes.
Médicos e enfermeiros entrevistados relataram que essas experiências não foram relativas a confusão mental resultante da medicação ou processos tóxicos envolvidos na morte e que ocorreram com consciência clara. As visões no leito de morte foram compreendidas como eventos com um significado espiritual para o paciente muitas vezes ajudando-o a deixar a vida física sem medo de morrer. A maioria dos pacientes encontrou a liberação da agitação e ansiedade, morrendo em paz após as visões no leito de morte. Outros fenômenos como coincidências, aparições de parentes ou amigos distantes, sonhos vívidos com caráter apaziguador, motivação de resolver questões pendentes como a conciliação com os familiares podem acompanhar a fase terminal do enfermo, como uma preparação à morte.
Dr Julio Peres afirma que ele mesmo e muitos colegas que acompanharam de perto pessoas próximas à morte, dando suporte psicológico inclusive para seus familiares, percebem que os envolvidos parecem oscilar entre dois mundos. “Mesmo para aqueles mais céticos, a aproximação com a morte passa a ter um sentido de passagem para outro mundo. As visões espirituais no leito de morte acontecem com freqüência, e vão desde o medo e a agonia à aceitação serena”. Percepções similares às visões no leito de morte foram relatadas anteriormente por sobreviventes de paradas cardíacas em publicações cientificas sobre Experiências de Quase Morte.
As resistências dos profissionais da saúde em considerarem a natureza espiritual diminuem. Após a realização dos estudos em hospitais na Inglaterra, sendo o assunto legítimo para a investigação médica, o tabu de falar sobre experiências espirituais no leito de morte atenuou e os profissionais sentiram que o tema poderia ser discutido mais abertamente. Quase todos os entrevistados expressaram preocupação sobre a falta de educação e formação sobre as experiências do final da vida e requisitaram módulos sobre o tema nos cursos de especialização em cuidados paliativos.
A profissão médica está entre as profissões com maiores índices de suicídio, e esses índices estão relacionados com a perda da onipotência e a crescente ansiedade pelo temor em falhar. Até agora, evidência foi limitada para a eficácia das intervenções para reduzirem os níveis de estresse nos profissionais da saúde. A despeito das louváveis tentativas, as intervenções até então utilizadas não foram capazes de reduzirem sintomas da Síndrome de Burnout provavelmente porque o principal desencadeante da síndrome não foi abordado nessas medidas preventivas.
“Não é preciso esperar o fim da vida para abrir os olhos à dimensão espiritual do ser humano. Existem robustas evidências de distintas linhas de pesquisa que contrapõem a teoria da morte como finitute da vida, e esse corpo de pesquisas pode contribuir para aplacar a síndrome de Burnout decorrente da impotência e incapacidade de lidar com a morte” – finaliza Dr. Julio Peres.